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Isenção de Imposto de Renda: projeto para recuperar popularidade

Com os índices de desaprovação em alta, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aposta na aprovação do projeto de isenção do Imposto de Renda a quem ganha até R$ 5 mil para recuperar a popularidade.

A medida integra a lista de 25 prioridades da equipe econômica apresentada nesta semana pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao novo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB).

O detalhamento do projeto de lei do Executivo está cercado de expectativas. Além dos questionamentos sobre os impactos fiscais, também há dúvidas sobre o reflexo nas demais faixas de tributação.  

Nesta quinta-feira (6), Lula defendeu a ideia para promover “justiça social” e disse ter certeza que o PL será aprovado pelo Congresso.

“Quem ganha alto salário, não paga Imposto de Renda. Quem paga Imposto de Renda é quem recebe holerite no final do mês. O que queremos é fazer justiça social. Fazer com que quem ganhe menos, pague menos. É assim no mundo inteiro”, afirmou o presidente. “Tenho certeza que a Câmara e o Senado aprovarão.”

Na avaliação de tributaristas ouvidos pela Gazeta do Povo, além de gerar preocupações fiscais, a medida é populista, não soluciona as distorções tributárias e pode criar mais desigualdades. Segundo eles, as novas regras podem prejudicar a classe média, a depender do desenho das demais faixas de tributação.

“Embora apresentada em prol da justiça tributária, a decisão é essencialmente populista, desprovida de fundamentação econômica sólida e preocupada mais com o impacto eleitoral imediato do que com a sustentabilidade do país”, diz o especialista em direito tributário Leonardo Roesler. “[O governo] privilegia o aplauso momentâneo em detrimento da responsabilidade fiscal e do planejamento de longo prazo.”

Isenção preocupa mercado por compensação da renúncia fiscal

Anunciada incialmente em novembro, junto com o pacote de corte de gastos do governo, a isenção saiu de cena após a repercussão negativa no mercado financeiro. O anúncio simultâneo intensificou a desconfiança sobre a disposição do governo em promover o ajuste fiscal.

A preocupação é sobre a forma de compensação da renúncia fiscal, estimada em R$ 35 bilhões anuais. O governo falou em criação de um imposto mínimo de até 10% para rendimentos superiores a R$ 50 mil mensais.

Hugo Motta frisou que a Câmara não votará nenhum projeto que gere aumento de despesas sem a devida contrapartida. Haddad, por sua vez, afirmou que o desenho da compensação precisou de ajustes, mas já está na mesa do presidente Lula.

“Nenhuma renúncia fiscal pode ser feita sem compensação. Nós terminamos o desenho”, afirmou aos jornalistas na Câmara dos Deputados na quarta-feira (5). “Só não vou adiantar porque não tenho autorização do Planalto.”

Distorções podem ampliar ônus sobre a classe média, dizem tributaristas

A isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil atenderia a uma promessa de campanha de Lula em 2022. Atualmente, só está isento da tributação quem recebe R$ 2.824 por mês – o equivalente a dois salários mínimos de 2024.

Com a atualização realizada em 1.º de janeiro, o piso salarial passou a R$ 1.518, o que significa que dois salários mínimos agora correspondem a R$ 3.036. Porém, a tabela do IR não foi atualizada.

A partir desse valor, as alíquotas são progressivas – de 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%, conforme a faixa de renda. Pela tabela vigente, vencimentos a partir de R$ 4.664,68 já estão sujeitos à alíquota máxima.

Tatiana Migiyama, especialista em Gestão Tributária da Fundação Instituto de Pesquisa Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), acredita que o governo manterá as alíquotas progressivas partindo do valor de isenção de R$ 5 mil.

“Mas deve haver uma regra de transição para que não se instale um ‘terrorismo tributário’”, diz. “Por exemplo, de quem ganhar um real a mais que o mínimo ser enquadrado na faixa de 27,5%. Nesse caso, a mudança seria ainda mais injusta e atingiria mais a classe média.”

A preocupação é compartilhada por Leonardo Roesler. Para ele, ao excluir da base de arrecadação uma parcela considerável dos contribuintes, o impacto financeiro pode gerar um “efeito cascata”, pressionando por ajustes nas alíquotas da tabela progressiva, especialmente para rendimentos médios, historicamente mais tributados.

 “A falta de atualização periódica das faixas de tributação, historicamente observada no Brasil, já resulta em uma carga mais pesada para contribuintes de rendas médias, que, na prática, acabam arcando com uma parcela desproporcional do ônus fiscal”, diz. “A isenção para rendas de até R$ 5 mil poderá acentuar essa distorção, concentrando a carga tributária ainda mais sobre os contribuintes das faixas intermediárias.”

Além disso, o tributarista alerta para os riscos de judicialização da alternativa de compensação por meio de imposto mínimo para rendimentos superiores a R$ 50 mil mensais. “Embora atraente no discurso, há grandes chances de judicialização, dado ao histórico de resistência a novos tributos sobre lucros e dividendos”, diz.

“O país precisa de reformas tributárias estruturais e voltadas para a progressividade, com foco na tributação de patrimônio e rendas elevadas, enquanto se desonera o consumo e se simplifica o sistema”, defende Roesler. “Medidas isoladas e de caráter populista, longe de ser um avanço, representam um retrocesso disfarçado de justiça tributária.”

Solução seria atualização completa da tabela do Imposto de Renda

Para a tributarista Maria Carolina Gontijo, palestrante do Instituto Millenium, a justiça tributária estaria mais perto se o governo promovesse a atualização da tabela do Imposto de Renda.

Desde 2015, data da última revisão, não houve ajustes significativos. Em 2023 e 2024, o governo Lula apenas alterou o limite de isenção para dois salários mínimos (o equivalente, no ano passado, a R$ 2.824). Na prática, porém, esse limite só vale para pessoas que ganham no máximo esse valor e têm direito a uma espécie de antecipação do desconto simplificado do IR. Para quem ganha mais de dois pisos salariais, vale uma outra tabela, na qual a isenção vai só até R$ 2.259,20.

“O governo fez uma ‘gambiarra’ na ocasião e aparentemente, vai seguir a mesma lógica agora”, diz. “Usar o mesmo mecanismo e ir vendo como fica. O que a gente tem de entender é que precisa, sim, de uma atualização da tabela do Imposto de Renda. Qual que é o grande problema disso? É o custo. Eu já vi contas estimando acima de R$ 100 bilhões que o governo teria de abrir mão para atualizar a tabela. Mas tinha de encontrar um jeito.”

A tributarista defende uma reforma da renda que concilie uma revisão da tributação da pessoa jurídica e da física, juntas, como feita no caso da reforma do consumo.

“Sou extremamente contrária a fazer a reforma da renda faseada. A gente precisaria fazer tudo de uma vez para que as coisas fizessem sentido, porque a renda da pessoa física está diretamente atrelada à pessoa jurídica”, explica. “Mas este é o caminho certo e difícil, toma mais tempo e dinheiro. No Brasil a gente tem essa mania de tentar fazer tudo pelo jeito mais fácil.”

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