Quando saímos em busca dos sabores do Sudeste, Minas Gerais aparece como um território onde comida, afetividade, tradição e memória se intercalam em um banquete delicioso. Falar de Minas é falar de queijos, de torresmo, de produtos artesanais e, principalmente, de pessoas apaixonadas pela sua terra natal.
Na minha jornada em busca dos sabores do Sudeste para a temporada especial CNN Viagem & Gastronomia: Sabores do Brasil, aterrissei em Belo Horizonte para degustar um “cadinho” dos sabores do estado.
Para cumprir a missão, fui até o Mercado Central, um dos pontos turísticos mais emblemáticos da capital mineira, para experimentar queijos diversos, um mais gostoso que o outro. Para arrematar a experiência, um almoço no Xapuri, com direito a torresmo, angu e panelas no fogo a lenha, coroou minha passagem por “Beagá”.
O mercadão e os queijos mineiros
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Os aromas e os sabores mais marcantes da cultura mineira se cruzam nos corredores do Mercado Central de Belo Horizonte, no centro da cidade.
Nascido em 1929 como uma feira ao ar livre ao lado da Praça Raul Soares, as barracas ficaram ali até 1964, quando, após idas e vindas, os feirantes se reuniram para cobrir o local com um galpão. Hoje, 95 anos depois, o Mercado soma mais de 400 lojas, que levam até a nossa boca o que de melhor Minas oferece.
Além do fígado com jiló do Bar da Lôra e do torresmo do Rei do Torresmo, a minha paradinha dessa vez se deu na Roça Capital, armazém tipicamente mineiro com delicinhas do estado, incluindo antepastos, azeites, cafés, doces e geleias.
Mas são os queijos artesanais que roubam a cena. Uma variedade deles pode ser degustada no balcão.
“Todo Queijo Minas Artesanal precisa ser feito com quatro ingredientes: leite cru de vaca, sal, coalho e pingo, que é o fermento lácteo natural. Além disso, precisa ser prensado manualmente e maturado em prateleiras de madeira. Cada região tem seu período de maturação. Na Canastra são 14 dias e em outras regiões pode ser de 17 a 22”, explica Eduardo Girão, jornalista e especialista em queijos.
Experimentar os mais diversos tipos da iguaria vira uma verdadeira celebração com o recente título de Patrimônio Imaterial da Unesco para os “Modos de Fazer o Queijo Minas Artesanal”. O reconhecimento veio em dezembro, sendo o primeiro produto da cultura alimentar brasileira a ter o título chancelado pela agência da Organização das Nações Unidas (ONU).
Os queijos são produzidos em todo o estado, mas a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-MG) distingue 10 microrregiões como produtoras de Queijo Minas Artesanal. São elas: Serro, Serra do Salitre, Araxá, Campos das Vertentes, Canastra, Cerrado, Diamantina, Entre Serras: da Piedade ao Caraça, Serras de Ibitipoca e Triângulo Mineiro.
Em Minas, são mais de 8.800 estabelecimentos destinados à produção dos diversos tipos de queijos artesanais.
Queijo da Canastra e outras delícias
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Um dos queijos mais vendidos no local é o Canastra. Um dos exemplares da casa é o Capim Canastra, um dos primeiros queijos brasileiros premiados na França, já que levou medalha de prata em 2015 no Mondial du Fromage de Tours, o “Oscar” do queijo mundial.
“O Queijo da Canastra tem uma acidez menor e, à medida que vai maturando, torna-se mais picante. Alguns produtores o fazem com a casca lisa e outros deixam com a casca rústica, a qual enruga e possui manifestação dos mofos naturais da propriedade”, diz Eduardo.
Outro exemplo interessante é o Queijo JM, produzido em Alagoa, na Serra da Mantiqueira. É um queijo que pode lembrar o parmesão, com toque mais leve e massa dura.
Agora uma dúvida que não quer calar: come-se ou não a casca do queijo? “Muitas vezes a casca faz parte da experiência. Ela traz crocância e traz complexidade na percepção de sabores e aromas. Muitos dos aromas estão presentes na casca, mas não na massa”, enfatiza Eduardo.
Se ficou com gostinho de quero mais e deseja experimentar queijos mineiros de diferentes formas, minha dica é ler esta matéria para organizar sua próxima viagem a BH.
Comida mineira típica
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Banquete mineiro teve como prato principal coxa desossada grelhada na manteiga com molho de laranja servida com angu, tomate sem pele e requeijão com raspas • CNN Viagem & Gastronomia
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Torresmo de barriga e pururuca do Xapuri • CNN Viagem & Gastronomia
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No Xapuri, Daniela Filomeno aprecia almoço tipicamente mineiro ao lado do chef Flávio Trombino • CNN Viagem & Gastronomia
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Como uma boa neta de mineiro, resumir as tradições culinárias de Minas Gerais em queijos é quase um sacrilégio. Por isso, um almoço no restaurante Xapuri dá conta de mostrar um pouquinho mais dos sabores do estado com ajuda de uma mesa farta.
Parada obrigatória em Belo Horizonte, aqui a comida mineira é tratada como uma instituição. Pão de queijo, pastel de angu, torresmo, jiló com queijo, feijão tropeiro, frango com quiabo e cachaças não faltam.
“A comida mineira começa a ter esse formato e identidade a partir da vinda dos portugueses. Ela é uma tríade indígena, africana e europeia”, conta Flávio Trombino, chef à frente do Xapuri.
Enquanto conversamos, a lenha estala e as panelas de barro fumegam. Para o almoço, ele prepara uma coxa e contra coxa desossadas, grelhadas na manteiga com suco de laranja.
O angu mineiro também está aqui e, apesar de levar tradicionalmente somente fubá e água, o da casa segue a moda italiana, com queijo, leite e manteiga. A carne é servida ainda com tomate tostado sem pele e requeijão com raspas.
Flávio é guardião do fogão a lenha e da comida caipira, ensinamentos transmitidos pela sua mãe, Nelsa Trombino, fundadora do restaurante e que nos deixou em 2023.
Para o chef, o que é o sabor do Brasil? “É diversidade e riqueza. O Brasil é gigantesco. A França cabe dentro de Minas Gerais, por exemplo”, responde. Mas vou além. E o sabor de Minas, qual é? A resposta é simples, mas poderosa. “É afetividade”, crava o chef.
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