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Brasil deve usar Brics para minimizar “efeito Trump” COP-30

Com o retorno de Donald Trump à Casa Branca, o governo brasileiro se vê diante de desafios em suas pretensões de usar o campo ambiental para se projetar internacionalmente. O republicano retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris e tem uma posição crítica a gastos elevados com pautas ambientais. Diante disso, para tentar evitar o esvaziamento da COP-30, que o Brasil sedia em novembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deve fortalecer sua colaboração com os membros dos Brics.

Os analistas consultados pela Gazeta do Povo avaliam que a eficácia dos planos de projeção internacional de Lula vai depender da capacidade do governo brasileiro de reunir apoio global e garantir que os países arquem com compromissos concretos pela redução de emissões, o que pode ser desafiador com o retorno de Donald Trump.

A atuação do presidente dos EUA, avaliam os especialistas, pode acabar causando o chamado “efeito Trump”, ou seja, influenciar outros países a adotar ações parecidas e, consequentemente, enfraquecer a COP.

O gerente de Energia e Sustentabilidade da BMJ Consultores Associados, Leon Norking Rangel, afirma que a possível ausência dos Estados Unidos no encontro deste ano em Belém (PA) pode ser um “baque”, já que o país, ao lado da China, é um dos maiores emissores de gases poluentes.

“O real fracasso da COP-30 vai depender muito também de quem vai continuar participando [das discussões acerca do evento]”, avalia Rangel.

A Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP) é o principal evento para discutir ações ambientais e climáticas do mundo e tem sido a aposta de Lula para este mandato para sua política externa.

Nesse sentido, os especialistas explicam que o governo brasileiro deve buscar fortalecer sua liderança global em questões ambientais por meio de outras nações, como é o caso das que compõem o bloco dos Brics. Ou seja, Lula vai estimular o engajamento dos Brics para tentar criar uma base sólida de apoio durante a realização da cúpula.

Na COP-30, prevista para acontecer no mês de novembro em Belém, a expectativa é de que o Brasil apresente diretrizes para implementação e adaptação dos países para alcançar as metas definidas na COP anterior, quando se estabeleceu que os países devem investir US$ 1,3 trilhão em ações ambientais. Sem o engajamento dos Estados Unidos nessas discussões, o receio é de que pouco avance sobre o tema.

Por isso, os organizadores do evento já estão dizendo que o maior desafio diplomático será de natureza imaterial: tentar reverter a ideia cada vez mais aceita de que o investimento em combate à mudança climática prejudica a economia.

Brasil preside o Brics e deve tentar alinhar pauta do grupo com a COP-30

O Brics é um grupo de nações emergentes inicialmente formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Atualmente, entre seus membros plenos, o bloco também agrega Egito, Emirados Árabes, Etiópia, Indonésia e Irã. Há ainda outros nove países parceiros: Belarus, Bolívia, Cazaquistão, Cuba, Malásia, Nigéria, Tailândia, Uganda e Uzbequistão. Para analistas, o bloco pode ser um ativo para Lula durante a COP-30.

Entre as prioridades elencadas pelo governo durante a presidência dos Brics, está o “aprimoramento das estruturas de financiamento para enfrentar as mudanças climáticas, em diálogo com a COP-30”. Ou seja, como atrair dinheiro de países desenvolvidos para países em desenvolvimento sob o argumento de combater a mudança climática.

Para o sócio-diretor da Agroicone, Rodrigo Lima, é um caminho natural que o governo brasileiro utilize os Brics como um “trilho” para obter um bom desempenho na COP-30.

“O Brasil usou o trilho do G20 e vai usar o dos Brics. Tem países importantes no grupo que precisam da agenda climática como forma de ganhar dinheiro e fazer transições que melhorem a vida desses países, e não é só sobre a emissão de gases de efeito estufa”, afirma Lima ao opinar que a agenda climática é uma agenda econômica.

O especialista relembra ainda que países como China, Índia e Indonésia têm histórico de engajamento com as pautas ambientais, além de interesses econômicos por trás do tema.

“Se olharmos para a China e tudo que ela tem feito em investimento em energias renováveis e em veículos elétricos, hoje nós temos um mar de veículos chineses em vários países. Ela está exportando carro elétrico para ganhar dinheiro”, pontua Rodrigo Lima ao mencionar a chinesa BYD.

Analistas apontam que ao desencorajar o incentivo a questões ambientais, Trump pode criar um vácuo no mercado de iniciativas sustentáveis, o que abriria uma oportunidade para a China assumir uma posição de liderança nesse quesito.

De acordo com dados da BBC News, Pequim já lidera diversos setores ligados ao desenvolvimento sustentável. O país controla cerca de dois terços da produção global de turbinas eólicas e fabrica oito em cada dez painéis solares. Além disso, estima-se que a China seja responsável por mais de 60% do mercado mundial de veículos elétricos.

Leon Norking Rangel, gerente de Energia e Sustentabilidade da BMJ Consultores Associados, relembra ainda que o regime chinês é o maior investidor em tecnologias verdes e desenvolvedor de tecnologias verdes do mundo. Rangel pontua ainda que outros países dos Brics também têm interesse nessa área.

“A Índia tem investido pesado em energias renováveis assim como petro-Estados do Golfo, como a Arábia Saudita, os Emirados Árabes e os outros da região. Eles têm um comportamento dúbio: ao mesmo tempo que produzem muito petróleo, estão investindo em energias renováveis. Esses países também têm um mercado de crédito de carbono voluntário que está se desenvolvendo. Portanto, é bastante dinheiro alocado por muitos países que dificilmente vão abandonar a agenda verde”, avalia Leon Norking Rangel.

Para o analista, o Brasil tende a utilizar sua articulação com essas nações e seu posto de presidência dos Brics para consolidar o apoio desses países em decisões da COP.

“O Brasil pretende seguir as declarações do G20, que foram muito pautadas por justiça social e questões ambientais, num contínuo que vai envolver os Brics e a COP-30. Ainda vejo o caminho de uma possível vitória diplomática para o Brasil ao chegar na COP com o apoio dos Brics, dentro do que for possível, e da União Europeia”, afirma Rangel.

“Efeito Trump” pode afastar países do combate à mudança do clima

Desde que tomou posse, no dia 20 de janeiro, Trump já revogou cerca de 70 medidas ambientais de seu antecessor, o ex-presidente Joe Biden. Entre elas, Trump retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris (tratado internacional que estipula metas para redução do aquecimento global) e de outros compromissos sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês).

O Acordo de Paris, adotado em 2015 durante a COP daquele ano, é um tratado com o objetivo de combater as mudanças climáticas e limitar o aquecimento global. Ele busca manter o aumento da temperatura global abaixo de 1,5ºC em relação aos níveis pré-industriais, com a meta de não ultrapassar a marca de 2ºC. O acordo também exige que os países estabeleçam metas próprias para reduzir a emissão de gases de efeito estufa, que contribuem para o aquecimento do planeta.

Ainda que as discussões acerca de temas ambientais não sejam descontinuadas, a avaliação é de que a postura de Trump possa influenciar outros países e desacelerar o ritmo de decisões relacionadas à agenda verde.

A decisão do presidente americano de retirar os EUA do Acordo de Paris, por exemplo, já tem sido ponderada pela Argentina. O presidente argentino, Javier Milei, é alinhado com o republicano em temas relacionados à agenda verde e à pauta conservadora. O governo argentino, conforme já anunciou a imprensa do país, tem considerado abandonar o compromisso com as metas de mudança climática.

A agenda ambiental também deve perder força no Canadá. O premiê canadense, Justin Trudeau, vinha sendo uma voz ativa das políticas ambientais em seu país e chegou a adotar medidas ambiciosas durante seu governo, como a meta de zero emissões de carbono até 2025. Trudeau, contudo, renunciou ao cargo e deve ser substituído nos próximos meses por Pierre Poilievre, líder do Partido Conservador e alinhado a Donald Trump, representando mais um desafio para o Brasil nas negociações da COP-30.

A onda da direita na Europa também pode impactar o avanço dessas discussões. Os países europeus, sobretudo aqueles que formam a União Europeia, têm sido grandes interlocutores de políticas ambientais e de medidas para conter o aquecimento do planeta. Esse cenário, contudo, pode passar por mudanças, com alternâncias de governos e uma possível ascensão de líderes conservadores no continente europeu.

República

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